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| Banquinho em que Júlia Maiochi Zanetti sentava para amamentar (feito pelo esposo Antônio) |
terça-feira, 11 de novembro de 2025
Pequenas conversas familiares
segunda-feira, 10 de novembro de 2025
Pequenas conversas familiares
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| Panela de fazer polenta da avó Ângela Da Ré |
Como parte das memórias de família, inicio aqui uma série de breves entrevistas com parentes. Quem abre essa jornada é Ângela Teresa Migot, que relembra as tradições, valores e lembranças herdadas de seus pais (Antônia Maiochi e Luiz Nicola) e avós italianos. Histórias que ajudam a manter viva a identidade e a alegria de nossas origens.
Para você, o que significa ser descendente de italianos hoje
em dia?
Ser descendente de italianos, para mim, significa ser muito
alegre, comer muito, ser trabalhador, e ser de família grande.
Tem alguma tradição italiana que você gostaria que a nossa
família mantivesse viva?
Celebrar nas grandes festas do ano, com muita comida,
bebida, dar boas risadas, falar alto como se fosse uma briga.
Se você pudesse fazer uma pergunta para o nosso antepassado
que imigrou, o que você perguntaria?
Perguntaria se valeu a pena ter vindo para esta terra, e
como ficaram as pessoas queridas que não vieram?
Qual é a sua comida italiana favorita da família, e o que
ela te faz sentir?
A comida preferida é a “polenta”, que me faz lembrar
histórias de minha mãe, este alimento tão abençoado que alimentava a enorme
família de meus nonos.
Se você pudesse visitar hoje a cidade na Itália de onde
nossos antepassados vieram, o que você acha que sentiria ao chegar lá?
Voltando às origens, sentiria um misto de angústia e
tristeza, porque eles não saíram para dar um passeio qualquer, mas tiveram que
deixar suas tradições, amigos, raízes, para enfrentar uma terra nova
desconhecida. Há de ter sido um sofrimento muito grande.
Tem alguma expressão, palavra em italiano ou dialeto que
você conheça e que a família ainda usa sem perceber?
Expressões que se usava e até hoje: Dio bono; Dio keko.
O que você acha que herdamos de 'jeito italiano' no nosso
jeito de ser?
Herdamos a alegria, falar alto com gestos, rir muito alto.
Tem algum objeto em casa que pra você representa essa nossa herança?
Tenho uma panela, que minha mãe contava, que a nona fazia as
refeições (muito arroz). E também um grande caldeirão, que preparava gordura de
porco e torresmos.
O que você acha que os italianos que vieram para o Brasil
sentiriam ao ver nossa família hoje?
Hoje eles ficariam decepcionados e tristes com a crença,
seria difícil entender as mudanças da religião dentro da família.
Você já imaginou como seria sua vida se a nossa família
nunca tivesse saído da Itália?
Teria uma vida normal, com todas as virtudes da época. De
bem com a vida, muito vinho, massas e cuidando sempre da vida alheia.
O que você gostaria que os filhos ou sobrinhos soubessem
sobre a nossa origem italiana?
Que nossos antepassados foram valentes, época de fome,
doenças, e guerras, e também nossos pais, estavam saindo da escravidão, ocasião
em que a imigração foi incentivada para substituição de mão de obra rural.
Se você pudesse ensinar uma única tradição italiana para
todos os seus amigos, qual seria e por quê?
Uma tradição que mais me marcou: a família, e os parentes,
sempre unidos, nas comemorações e festividades (sempre festas religiosas) e
também nos casamentos, aniversários, batizados, tudo com muitos assados, e
vinhos, e bastante alegria.
(Ângela Teresa Migot é filha de Antônia Maiochi e Luís
Nicola, casada com Antônio Migot)
quinta-feira, 30 de outubro de 2025
A viagem de uma vida: a Itália que nossos antepassados deixaram para trás
Quando pensamos na imigração italiana, logo lembramos dos nomes de nossas famílias e das regiões de onde vieram. No meu caso, o coração do Norte da Itália, no final do século XIX.
Mas que Itália era essa que nossos bisavós e tataravós
deixaram para trás?
Quando nosso bisavô ou tataravô embarcou num navio com uma
mala de vime e um sonho, ele não estava apenas cruzando um oceano. Estava
fugindo de uma realidade complexa e, muitas vezes, desesperadora. Entender a
Itália daquele tempo não é apenas um exercício de história; é a chave para
compreender a coragem, os medos e as motivações que moldaram o início das nossas
famílias no Brasil.
Ao contrário do Sul, o Norte não era marcado pela pobreza
extrema dos latifúndios, mas por uma crise silenciosa e profunda. A
unificação italiana, concluída em 1870, cobrou seu preço: impostos altíssimos
para financiar a nova nação pesavam sobre pequenos agricultores e artesãos.
Muitas famílias do Vêneto, por exemplo, trabalhavam em
minifúndios e sofriam com a escassez de terras para dividir entre os filhos.
Enquanto isso, as cidades, como Milão, começavam sua industrialização, mas não
rápido o suficiente para absorver todos.
Foi nesse contexto de esperança contida que a
notícia das fazendas de café no Brasil chegou, trazida pelas cartas dos
primeiros imigrantes. A promessa de terra própria e um futuro próspero foi o
vento que encheu as velas dos navios. A grande esperança: a Mérica.
Eles não eram fugitivos da miséria absoluta, mas sim conquistadores
em busca de oportunidade. Deixaram para trás as paisagens dos vinhedos e as
planícies não por desespero, mas por uma coragem calculada – a coragem de
construir um novo legado sob um céu tropical.
Honrar sua memória é lembrar que nossa família foi
construída sobre a base sólida da resiliência e do trabalho desses pioneiros.


